quinta-feira, 16 de setembro de 2021

Araras, Jandais, Maracanãs e Zepelins

Quando me dirigi ao Parque Eduardo VII, em Lisboa, eu sabia muito bem o que deveria fazer. Eu fui a 91ª Feira do Livro de Lisboa. Fui comprar o livro Liberdade - Antologia da Literatura Livre. Fiquei sabendo que, na dita antologia, constavam versos de um dos meus poetas prediletos, o barra-condense Jorge Abreu. Dei com os burros n’água, já que os versos deste nobre poeta integram antologia diversa, similar, da mesma editora - Chiado Books; só que na versão brasileira, e disponível, portanto, apenas em território nacional.

 

A presente edição da Feira já é considerada a maior de todas. São ao menos uns três quilômetros de muitas, muitas bancas, e um número quase infinito de títulos. O calor estava insuportável. Cheguei por volta das 2h da tarde e fui dos primeiros a entrar. Para amenizar o calor, um chuvisco artificial caia de mangueiras finas, instaladas por sobre o parque e refrescava os visitantes.

 

Bateu-me alguma frustração que logo passou, ante meu devaneio com um bando de araras a grasnar como doidas nas árvores ao lado do parque. Sei que por aqui existem jandaias, mas não são abundantes como no Brasil. Elas estavam a fazer uma verdadeira festa.Transportaram-me para Barra do Corda em um Zeppelin dourado. De longe vi a clareira onde eu queria pousar: a velha olaria à frente da casa do Manoel Dodô, na Rua do Sítio dos ingleses. Passei boa parte da minha infância e adolescência com os pés fincados na massa liguenta e pesada do barro que amassávamos para fazer tijolos.

 

No Zeppelin levava uma pesada carga de bombas: livros de todos os tamanhos, cores, temas e autores. Alguns eu deixaria cair levemente amarrados em balões e com destinos certos. Outros, aqueles bem pesados e volumosos, atiraria do meu canhão, com toda força, contra a ignorância, o preconceito, a intolerância, o atraso econômico, social e tecnológico.

 

As jandaias maracanãs, araras e periquitos de todas as cores que me fizeram a guarda, durante todo o trajeto desde Lisboa até Barra do Corda, enfileiradas, recebem, cada uma, encomendas a serem entregues em endereços certos, a meninos e meninas, senhoras e senhores, de todas as classes sociais, principalmente a dos excluídos, que têm seus rostos iluminados pelo conteúdo das encomendas. Livros para todos os gostos, dos clássicos da literatura ao mais desconhecido dos autores. Livros coloridos e cheios de fotos, com paisagens e desenhos que contam histórias fascinantes.

 

O Zeppelin parte com o seu capitão sem que seja notado, uma vez que todos os que lêem seus livros não querem se distrair com objetos voadores imaginários, os quais, na verdade, estão dentro dos livros que lêem.

 

Fui-me da Feira do Livro de Lisboa, com a imagem do Zeppelin na cabeça. Não comprei antologia nenhuma, mas, “Pensamentos Vadios”, de Vanessa Pires Rodrigues, levei-o debaixo do braço, porque, pelo título, bem que podia ser um livro de Jorge Abreu.

 

Wan Lucena

 

 
Esta crónica foi publicada originalmente na revista eletrónica Turma da Barra a quem muito agradecemos: 

https://www.facebook.com/jornalturmadabarra/posts/2036025509896161

 

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