Sentei-me num dos confortáveis sofás da Feira do Livro de Brasília
e comecei a ler Quincas Borba, de Machado de Assis. Veio-me certa culpa e
vergonha por não ter lido o livro que é obrigatório, ainda no primeiro grau de
estudos. Eu nunca pude me dar ao luxo essencial da leitura, mesmo que dos
grandes nomes, mesmo que o desejasse. Eu sempre fui desejoso da boa leitura e
me encantava a cultura. Mas, o acesso era escasso. Primeiro na roça, depois...
já na cidade, que de tão pequena, muitos sequer ouviram falar dela, minha vida
sempre foi de muito trabalho. E a escola era uma obrigação à qual eu bem sabia,
precisava dela para sair da penúria. Sempre tive medo das provas e dos
professores, embora, tenha ficado de recuperação uma única vez, na sétima
série, em matemática, matéria que sempre odiei e tive pavor. Até hoje pago caro
por tal carência.
Mas, ali sentado naquele sofá cinza, senti-me confortável e
comecei a deleitar-me com a leitura quando uma criança demoníaca começou a
correr e gritar em notas que uma cantora lírica não alcançaria. Feira é feira –
pensei. Que podia eu esperar? Os pais sequer eu soube quem era no meio de tanta
gente. A criança endiabrada corria por todos os cantos e, por mais que
tentasse, ela não desaparecia de meus olhos e seus gritos e entravam juízo á
dentro como se navalha fossem. Fechei o livro e fiquei ali a observar a cena.
A feira estava sem grandes atrativos e o sol intenso que
batia pelas imensas janelas do Centro de Convenções fazia do local um forno
apesar do ar condicionado. Os corredores de stands eram todos iguais, bem como,
os próprios stands. Não encontrei café que não o de garrafa e para comer,
alguns salgados sem graça. Mas, tudo bem, era apenas uma feira – pensei eu mais
uma vez.
É que por ser feira literária eu esperava as cores massala.
Esperava homens e mulheres com cara de eruditos e ambientes aconchegantes que
remetessem à alguma biblioteca. Mas, além estar em país tropical, nosso gosto
moderno por aqui não é muito elaborado. Na cena chamou-me a atenção um stand já quando de saída. Alguns cordéis, uns cestos de papelão e uma frase escrita: Por
favor, mexa! – O cesto estava cheio de livros de pouca atratividade para mim.
Mas, ali ao lado, um imenso e luxuoso book sobre uma mesa donde se podia ler em letras imensas – Lula, 500 anos de História. Retirei-me da feira
decepcionado, embora, com dois exemplares de um sebo. Acompanhar-me-ão por
algum tempo, além de Machado de Assis, um José Saramago.
Mas, talvez o problema não esteja na feira e sim em mim mesmo.