segunda-feira, 28 de maio de 2018

A Poesia da minha Janela

A roupa foi posta no varal e dança conforme o comando do vento que a levanta como se fosse uma bandeira e a deita novamente em movimentos suaves. Os pombos são um problema já que podem cagar tudo desde a varanda acima. O melhor é não deixar a roupa dormir no varal. De dia eles só querem comer as migalhas jogadas apartamento abaixo pelas velhas senhoras que se divertem com a cena. Mas, também tem os gatos. E esses não cagam sobre a roupa no varal. São umas dezenas e ficam sobre as lajes e muros. As mesmas velhas senhoras lhes jogam de um tudo. Pedaços imensos de carne ou ração industrializada. Quem lhes rouba bons nacos são as imensas gaivotas que veem a cena desde não sei de onde, desde o céu infinito e descem em vôo rasante e pousam suave e avançam sobre as carnes sem se importarem com os felinos. E os felinos, já acostumados, não se importam e sequer lhes olham. Os gatos devem ser todos castrados porque não os ouço a gritar quando de acasalamentos. E que alívio! Nada pior que gato no cío. Ouço gente no cío no apartamento acima, mas isso não me incomoda e faz parte da vida e de quem vive em sociedade. Não é sempre e não dura mais que meia hora e tudo se acalma e volto a dormir. A sinfonia de pássaros é durante todo o dia. Eles se aproveitam das migalhas e das muitas árvores que compõem o interior do quarteirão e para onde meu apartamento está voltado. E sinto certa inveja de quem tem a visão da rua e da ponte 25 de Abril, do Tejo, de Belém e de Alcântara. Inveja branca, diga-se! Mas, os frutos das árvores colorem o verde. O amarelo do limão siciliano é o que mais veja. Mas, tem o laranja da laranja e do pêssego. Tem o verde dos figos e tem flores de cores variadas. Não é algo que não se possa dizer ser sem graça. E tem muita poesia a olhar desde a minha janela!

terça-feira, 22 de maio de 2018

Deus é Melro

Fui ali no mercado comprar umas coisas e percebi o canto daquele passarinho preto daqui e canta tão parecido com o nosso sabiá ai do Brasil. No Largo da Igreja da Ajuda eles estavam aos bandos e a cantar feito doidos nas antenas acima dos telhados, nos fios de telefonia, nos braços dos postes de iluminação pública, nos balcões e varandas dos apartamentos, nos galhos das árvores, na torre e até no Galo de Barcelos que a enfeita. Uma sinfonia de Melros. 

Eu precisava saber que pássaro era esse. E de hoje não passaria. Qual o nome desse danado que canta, inclusive, madrugada à dentro e que ainda ontem me acordou às 4 horas. E eu não me incomodo, de maneira alguma, de ser acordado pelo danado que dorme em alguma árvore aqui perto da minha janela. Eu já voltava pra casa e quase me dirigi ao velhinho de bengala pra lhe perguntar qual o nome do passarinho, mas desisti ante o temor do incômodo. 

- Perguntarei ao Zé - o Zé é o dono da pastelaria que tudo sabe de todos. E se tudo sabe de todos iria me dizer o nome do sabiá português.

Parei na sua pastelaria e pedi o cafezinho e já fui perguntando. E o Zé não me decepcionou.

- É o Melro. Tem o Melro e tem a Melra. O Melro tem bico alaranjado e a Melra tem bico castanho.

E pronto! Voltei pra casa com minha curiosidade saciada. Se Deus não é o sabiá que pensei, agora sei, ele é Melro. Ou Melra!

Abaixo o endereço no YouTube para quem quiser ouvir o canto do Melro, o pássaro que me canta de dia e de noite. 



quinta-feira, 17 de maio de 2018

O Zé

O Zé, o da pastelaria daqui pertinho de casa e onde vou todos os dias a tomar um café e a comprar um ou outro pastel de nata, o famoso pastelzinho de Belém, vez em quando, daria pra escrever um livro sobre ele. A pastelaria é exatamente igual à qualquer outra. O espaço é pequeno e conta com apenas três mesas e o balcão de atendimento donde, por trás, está o Zé com o seu bigodinho português típico, sempre vestido de calças sociais e camisas riscadas mangas longas dobradas até metade dos braços, geralmente em tons azuis. Vez por outra saca dos bolsos o pacote de euros que quase não lhe cabe nas mãos e arranca alguma nota para o troco e fico a pensar: isso aqui fosse o Brasil... e  o Zé nunca mostraria esse horror de dinheiro. 

Ontem perguntei ao Zé se ela sabia quem era a minha estranha vizinha a qual jamais tinha visto e que mora um piso abaixo do meu e que me abordou na portaria para contar-me segredos de liquidificador. Estava a abrir o escaninho enquanto ela contava os mesmo segredos á outra vizinha que aproveitou para ir-se enquanto ela se aproximou do meu ouvido e me disse coisas que não entendi porque tão baixo me falava. Mas, pedi que repetisse e ela veio me contar que o seu vizinho de porta estava a traficar drogas e que eu tomasse cuidado. Nunca vi qualquer movimentação estranha aqui e, ante o nível dos moradores, desconfiei daquilo que me contava e logo pensei tratar-se de alguma doida despeitada e com problemas com o vizinho e que queria minha ajuda para difamar a reputação do moço que jamais vi. Eu a informei ser policial aposentado e ela me disse ser seu marido Chefe, com C maiúsculo, da PSP, a polícia civil daqui. Procurei sair em disparada logo que a portaria se abriu e ela se dirigiu a outro morador para continuar sua lamúria. Em sendo seu marido policial desconfiei ainda mais daquilo que me contava já que o marido poderia resolver o problema facilmente.

O Zé sabe da vida de todo mundo. São milhares de moradores no bairro e ele parece saber detalhes de todos. 

- É uma de óculos, cabelos chanel, faladeira? Não se dar com a Fátima.

A Fátima é outra vizinha que mora no apartamento ao lado da portaria e que abre a porta toda vez que percebe o barulho do portão só pra saber quem entra e quem sai. Cão de guarda melhor não há.

- Ela nunca foi casada e o tal chefe da PSP é seu amante e a mantém. Esteve ela internada em casa de repouso tempos atrás. Mora no primeiro piso no apartamento de frente pra rua. Não é?

Assustei-me com tantos detalhes sobre a vida da moça e fui-me embora certo de que doido aqui tem aos montes e que sou um deles. O Zé poderia ser a Maria Fofoqueira, mas ninguém o considera. Todos estão ali sempre ávidos por suas novidades e, basta ficar ali, quietinho no balcão a tomar o café e já se ouve aquele cliente a comentar os detalhes da vida do outro que acabou de pagar a conta e se foi. E quando me vou posso imaginar, com sorriso na cara, o que de mim falam. O bom é que já não mais me importa o que mim pensam ou falam, mas sim falra deles aqui no meu blog. 

quarta-feira, 16 de maio de 2018

Europa é isso aí!

Pensa-se que por ser Europa já não mais se veriam determinadas velhas profissões. Mas, na Praça da Figueira em Lisboa, o velhinho engraxate tem fila a lhe esperar e a placa na ruela perto da casa, em letras desleixadas e coloridas, pendurada sob o telhado baixo de casa humilde, informa em bom português: “amolam-se facas e tesouras”. As senhoras de costura estão aqui e ali a remendar, arrematar e até a fazer roupas, bem como, os altivos e, geralmente, esguios alfaiates. Estes se recusam a fazer as bainhas das minhas calças e trabalham apenas com roupa masculina. O barbeiro de bigode mustache enche de goma a cabeleira farta de um português sem dentes. Nas cidades medievais as artesãs de tapetes são cartão postal e os ferreiros fazem de armaduras de cavaleiros a chocalhos pra botar no pescoço da vaca. As doceiras fazem suas casas as guloseimas que estavam restritas aos conventos. O velho senhor que se veste de marrom todos os dias e que conserta cadeiras velhas e passa verniz na madeira a combinar com a cor da sua roupa. E não é tão difícil encontrar as velhas senhoras e suas agulhas, sentadas a beira das portas, a tricotar ou a crochetar. E tem as ciganas a abordar todo mundo e a vender suas bugingangas chinesas compradas lá Martin Moniz e que juram ser coisa de primeira. E na Praça da Figueira, muçulmanos e evangélicos, todos com cara de árabe, vendem as ervas que curam e aliviam, mas que não ão indicadas a menores de idade. E vendem coentro a dizer que é marijuana ou plástico marrom como se haxixe. É a Europa!

segunda-feira, 14 de maio de 2018

A Praça

Fui à Praça Martim Moniz comprar óculos que trazem as cores da bandeira francesa por estampa no lugar das lentes, pedido de um amigo brasileiro. A dita praça é linda e tem fonte luminosa e jatos que são erguidos em jatos rumo ao céu azul de Lisboa dessa época do ano. Entretanto, apesar de espremida entre Alfama, Mouraria, Rossio e mais famosos e charmosos bairros, é terra pedaço chinês. E chinês que se preze exerce a atividade de chingue-lingue. A atividade não é percebida se não se descerem aos porões dos edifícios ao redor da praça. Eu já tinha percebido a intensa movimentação de carroças cheias de caixas e carregadas pelos empregados morenos indianos que concorrem com os chineses nessa atividade. São vários subsolos de um edifício ao qual os corredores são tomados por mercadorias falsificadas e gente feia. O entra e sai de carrinhos com mercadorias lembram os catadores de recicláveis do Brasil. A cena lembra Bangladesh. Pra quem for fresco não é lugar indicado. O impulso é de segurar a carteira e fechar as narinas. Mas, apesar das aparências, não se conhece má fama do local e o que parece ser um formigueiro, na verdade, obedece certa ordem e a feira subterrânea é legal e seus comerciantes têm alvará de funcionamento. Se o produto é chinês, a praça é portuguesa e está ao pé do majestoso e imponente Castelo de São Jorge. E não se pode esquecer que em Alfama e Mouraria nasceu o fado e, num edifício comum de uma rua estreita ali perto, uma placa indica “Aqui nasceu Amália Rodrigues”, a grande dama do fado português. Mas, pra quem comeu buchada de bode e sarapatel numa feira qualquer de cidade nordestina isso aqui é shopping. E sou nordestino sim! E com muito orgulho!

sábado, 12 de maio de 2018

Há que Viver

Para mim é pouco difícil afirmar com total segurança sobre a qualidade de vida das cidades portuguesas que não conheço. De igual modo me fica difícil afirmar sobre a qualidade de vida de qualquer cidade em que estive por alguns dias ou horas a fazer turismo, atividade que em muito fica distante de se viver por algum tempo na localidade e, só assim, perceber todas as nuances do local. Mas, posso lhe informar que Portugal inteiro é maravilhoso e não sei lhe dizer qual cidade não lhe indicaria. Eu estive recentemente em Caldas da Rainha, cerca de 1 hora e meia de carro de Lisboa, e fiquei muito impressionado com o baixo custo de vida da cidade. É linda e fiquei tentado a experimentar viver ali. Tem comboios, ou seja, trens, que chegam e saem a todo instante rumo a todos os lugares do país e a estação fica bem no centro da cidade, assim como, a rodoviária. Em termos rodoviários os interurbanos são ótima opção. São seguros, limpos e confortáveis. Entretanto, preciso de mais pulsação. Lisboa e Porto me são mais cosmopolitas, modernas e oferecem muito mais, inclusive, aeroporto internacional para uma viagem de emergência. Essas duas cidades estão na moda e ficaram muito caras, é verdade. Mas, eu já me instalei aqui em Lisboa e já a sinto como minha. Não quero deixar de experimentar temporadas em outros lugares, cidades e até países. Mas, nesse momento, estou aqui e pretendo ficar por mais algum tempo.

Não conheço Aveiro, a Veneza portuguesa, mas dizem ser ótima. Aqui pertinho, às margens do oceano e ao sul de Lisboa, já nos limites da Reserva da Arrábida e entre Almada e Setúbal, há apenas 20 minutos de Lisboa, a bela Sezimbra é medieval e tem até castelo. É linda e aprazível. De preços, por ser praia, é igual a Lisboa. Mas, os brasileiros endinheirados gostam de Cascais e da região do Algarve. São muitas as prais e a juventude do surf é quem dita as regras. Bem mais ao norte me encantou Guimarães. Cercada de montanhas muito me lembrou a nossa Ouro Preto. O casario é lindo e tem até castelo medieval. Briga com Braga pelo título de ser ali donde surgiu Portugal.  Muita história, relíquias estão nos museus ou a céu aberto já que a andar se percebem as riquezas do passado dessa gente lusitana. Está bem próximo de Braga, outro orgulho português e que, assim como Lisboa e Porto, tá virando moda e os preços a subir. São lindas como todas as demais. Pode pesar contra para aqueles que não gostarem de frio já que, quanto mais ao norte, mais intensa a queda da temperatura.

Eu acho que, pra quem nunca experimentou viver em outro país e, se puder, o ideal é um estágio. Viver aqui por três meses com a passagem de volta na mão que pode nem ser usada. O processo de visto para reformados pode independer disso já que você pedirá, já aqui, o título de Residente não Habitual. Significa dizer que você não perderá seu visto português de residencia por se ausentar do país a maior parte do tempo desde que more aqui por, pelo menos, 3 meses ao ano. 

segunda-feira, 7 de maio de 2018

Deus não é Sabiá


Ele me desperta e eu o ouço a pensar se estaria doido esse sabiá pra cantar de noite e madrugada à dentro.  Eu ouvi muito sabiá a cantar no agreste maranhense e no cerrado do planalto central. Sei muito bem reconhecer o canto de um Sabiá. Eu ouço o mesmo canto, nas mesmas notas de canto assobiado em melodia que parece anunciar alguma explosão de felicidade ante á vida, tal qual sabiá. Entretanto, nuca ouvi contar que sabiá canta de noite, madrugada à dentro. Comecei a desconfiar não ser sabiá o passarinho que tanto canta. Tem alguma nota diferente ao canto desse sabiá, porém, quase imperceptível ao ouvido mais desatento. Eu ouço o canto dele para todos os lados e por todo o dia. Eu acordo com ele a cantar aqui abaixo da minha janela, escondido em algum limoeiro, laranjeira ou pessegueiro plantados nos fundos dos quintais dos apartamentos do térreo e que me colorem o quarteirão do que poderia ser pura monotonia monocromática. Lá pelas 4 da matina ouço o seu cantar melodioso e que me faz viajar rumo á minha infância rica de lembranças e de tanta escassez e de tanto suor e lágrimas de quem trabalhava na lavoura para plantar a semente que precisava ser colhida em grãos, raízes e frutos.  Ele canta até enjoar e pára até que o sol raia. Com os primeiros raios de sol volta a cantar feito doido de novo e é abafado pelos pardais que piam frenéticos desesperados e terminam de me acordar. Eu no deleite, insiste em permanecer na cama quando ouço gritos de algum outro pássaro que canta em gritos que parece, em muito, com os sons dos saguis nas florestas brasileiras. Entretanto, o que eu queria ver e ansiava por isso, era aquele sabiá. Semana passada fui ao Pingo Doce, o mercado do bairro, e quando voltava com as sacolas na mão, a subir uma dessas ladeiras daqui, no meio de uma florada de um pessegueiro, ouvi o canto do dando. Parei e finquei o pé disposto a ficar ali até que o visse no meio da florada que, por si só, já é alguma coisa que me lembra o exagero das cerejeiras em flor do jardim imperial japonês. E sei que vão achar a comparação demais, mas se pudessem ver o que lhes descrevo... há! Se pudessem! O sol estava intenso e me fez apertar as pálpebras em busca criteriosa, desde a direita para esquerda, como se um scanner fosse, naquela florada em busca do tal sabiá. Vi um passarinho preto pouco maior que um sabiá a encher o peito e soltar a melodia. Não era uma sabiá! Não é um sabiá! Não sei o nome desse sabiá preto português. Mas, vou buscar achar agora alguém que o saiba e lhes contarei o nome desse danado. Certo é que o passarinho preto é para mim aqui o meu sabiá que transporta em lembranças à minha infância ou às paisagens brasileiras. Mas, agora que já sei não ser sabiá aquele passarinho preto, fico também curioso com os passarinhos que nunca vi e que cantam como se fossem saguis. E aquele sabiá que pensava podia ser algum deus, agora é sabido, nem é sabiá.

quinta-feira, 3 de maio de 2018

Salada de Gente

De longe se ver o “Skina Brasil”, uma pastelaria de brasileiros - como não poderia deixar de ser - que vende pão de queijo e vaca atolada e que tem por proprietário o mineiro e fumante inveterado Jairo que é irmão da Cida que á dona do Salão de Beleza ao lado e que faz sobrancelha e arranca pelos e pentelhos à base da cera que ela mesma faz. A vaca atolada é boa e o pão de queijo é uma viagem ao Brasil das Gerais. 

Já mais à frente a velha senhora com cara triste e de doença faz arremates, remendos e bainhas nas calças, camisas e vestidos da vizinhança. Do outro lado rua a loja se enfeita de flores de plástico desde a telha até o chão. A senhorinha magra e maquiada com exageros de boneca de feira veste vestido rodado com motivos florais - como não poderia deixar de ser - gigantes e com mangas que parecem mais balões gigantes e calça sapatos vermelhos acolchoados e baixos pra ficar mais confortáveis.

Na rua as ciganas viúvas, para lá e para cá, vestidas de preto até à alma, cobertas por chales e lenços às cabeças, saias que arrastam ao chão e blusas com mangas que cobrem até à metade das mãos e pernas cobertas por meias que se enfiam em qualquer sapato. Tudo, mas tudinho, preto luto fechado e que em muito me lembram as aves de mau agouro de algum filme de Hitchcoch. Creio que essas senhoras dessa cultura - e aqui existem às multidões - torcem pra se tornarem viúvas e vestirem-se desse luto ao qual somente a morte lhes tirará e que levam com orgulho e para fazer inveja ás demais. 

Os sinos da igreja dobram e a cena das carolas portuguesas é de romaria nesse país que se orgulha de ser o mais católico da Europa. Descrever cada uma delas seria exercício que levaria alguns dias. Já na frente da igreja está o Mercado Municipal da Ajuda que não é tão grande, mas que tem gente aos montes e feirantes a gritar: “olha a banana!”. E a banana que consumimos aqui é sempre a mesma. Não tem variedade. A não ser que se busque como quem procura alguma joia perdida. A banana importada da América Central chega aos navios e é distribuída para todo o país.

O velho e histórico “elétrico” - e é só o bondinho que aqui tem aos montes e aos quais os turistas e lisboetas amam - pára e sobem e descem devagar todas as gentes. Mulheres com meninos barulhentos e idosos com bengalas. Ouvem-se vários idiomas e se percebe que a Babilônia é aqui. É primavera e os casais enamorados adoram está sob a luz intensa dessa cidade e na segurança que se goza por aqui. Os asiáticos e suas lojas de eletrônicos chineses vulgares e falsificados. A escola primária com os miúdos no recreio a fazer muito barulho e a atrapalhar a missa das carolas sem que elas reclamem. 

Tudo tão misturado e tudo tão diversificado quanto uma salada colorida em tigela grande e transparente sobre rica mesa. No geral, ouvem-se sorrisos e gritos. Parece que se está a gozar felicidade. Os murmúrios da dor não posso e nem quero ouvi-los.Bastam-me os meus!

quarta-feira, 2 de maio de 2018

O Pessegueiro

Aquele pequeno arbusto antes ressequido agora estava todo florido que mais parecia um bonsai lá perto do mercado Pingo Doce. Eu que nunca poderia imaginar que aqueles velhos gravetos fincados na terra e que me pareciam mortos poderia ser uma pequena árvore e agora todo em flor.  E que florada! Muito menos que poderia ser uma frutífera a dar frutos. Passou já um mês desse ocorrido e os frutos verdes já se percebem. Já estou a imaginar os frutos maduros amarelo ouro, amarelo Brasil. Agora saio em direção ao mercado para comprar o pão e a pensar no "pesgueiro". Ele não é uma árvore frondosa como a mangueira. Não, nem de longe. Plantado frente ao velho prédio donde uma senhora viu-me a fotografá-lo já em flor e me informou:

- É mesmo lindo o "pisgueiro", não é?
- Pesqueiro? - Perguntei eu
- Sim, um "pisgueiro" - repetiu
Que estranho? Pesqueiro? Pensei eu.
- Pesqueiro de "peixe" - insisti eu certo de que meus ouvidos me traiam ante o sotaque português tão difícil para mim muitas vezes.
- Não! De pêssego. É um pé de pêssego. 

Até que enfim! Agora eu sabia o nome dessa árvore que aqui enfeita ruas em alamedas que muito lembram os jardins imperiais japoneses e suas famosas sakuras, ou seja, as belíssimas cerejeiras.
São árvores de médio porte que, assim como como ipês brasileiros, apresentam floradas fartas e sem qualquer folha a interferir na florada. 

A velha senhora desde sua janela acima do varal de roupas estendidas travou comigo breve e agradável diálogo donde lhe mostrei em fotos os nossos ipês aos quais ela jamais ouvira falar.  Voltei para casa com os pães do Pingo Doce e uma vontade danada de ter um pessegueiro em frente à minha casa.


terça-feira, 1 de maio de 2018

Vítimas Divinas

Se Deus criou com suas próprias o inferno e jogou lá Lúcifer para que esse recebesse ali as almas condenadas por Ele próprio - e o E maiúsculo serve apenas para que o leitor aceite que estou a falar d'ele com E minúsculo.  Diante de tal constatação, compreende a lógica que Satanás, ex-Lúcifer, é mero gerente do inferno que continua a ser propriedade divina. 

Há quem vá dizer que estou endemoninhado. Mas, basta que se use a lógica para aceitar o que afirmo. Esquece por um momento tudo o que te fizeram crer e pensa como se jamais tivesses ouvido falar do tal deus cristão e me entenderás. Não é exercício assim tão difícil de fazê-lo. Antes de jogar-me pedras - exercício favorito dos cristãos, principalmente dos evangélicos, diga-se, a gente mais hipócrita do planeta -peço que te desnudes da tua crença e que penses. Apenas penses e reflitas sobre o que digo. Não é possível, ante a lógica, conclusão discordante da minha. Satanás foi condenado à gerencia do inferno criado pelo deus cristão. Satanás, o lindo e majestoso, nada mais é do que uma vítima dos desígnios divinos, assim como Judas, eu e você.

Satanás foi condenado a receber as almas que o deus cristão amoroso lhe envia aos montes e todos os dias. Assim, como Judas foi condenado por seus planos divinos a beijar o Cristo sem o qual e tal beijo não seria o Messias, o enviado. Era profecia que um dos seus discípulos teria que traí-lo. Assim sendo, qualquer advogado de porta de cadeia provaria ser, tanto Lúcifer - o anjo de Luz - quanto Judas, meras vítimas do deus satánico dos cristãos.