sábado, 24 de outubro de 2020

Rebu em Lisboa

Aqui em terras lusas gosto mesmo é de andar à pé, ou de autocarro - e aqui autocarro é o ónibus no Brasil - de comboio - comboio é o trem por ai - de metro - a pronuncia é metro mesmo e não metrô - de patinete, de bicicleta - e tenho uma dessas dobráveis para facilitar o acesso aos meios de transporte. E um Uber quando quero chegar mais rápido ao destino ou quando está a chover faz um bem danado. Automóvel, ao menos para mim,  é sinónimo de despesas mil e aqui o transporte publico é próximo da perfeição. Além de limpos, nunca atrasam.

Mas gosto mesmo é de bater pernas. Andar faz bem pra saúde e para as vistas. E eu tenho uma vista apurada para os detalhes que tu não tens ideia. A andar por essas ruas, becos, largos, praças, bairros e freguesias de Lisboa... dou de cara com a  Rua Triste-Feia. E fiquei a buscar a tristeza e a feiura dela e não achei. Trata-se de uma rua pequenina que conta com uns 300 metros de extensão, se muito, e que fica bem pertinho da Estação de Comboios Alcântara-Mar. 

Já na Rua da Janelas Verdes, na Lapa,  morou uma rainha pop, a diva, a poderosa... Madonna. Dizem que não aceitou ser tratada por reles mortal nesse Portugal socialista onde todos, ao menos na propaganda,  são iguais e foi um rebucetê danado quando a Junta de Freguesia - a prefeitura do bairro - lhe destinou dezesseis vagas de estacionamento publico. Houve uma gritaria geral já que os utentes - utente é o cidadão usuário dos serviços públicos  - não aceitaram o privilégio a ela dispensado. E a rainha bufou de desgosto, e dizem, levantou a saia e voltou para Nova York onde o Tio Sam sabe tratar os desiguais como desiguais.

Dias atras, passando por uma dessas ruas, dou de cara com a casa que foi de Amália Rodrigues, a grande do Fado. E tomar um café na A Brasileira, no Largo do Chiado, é para emocionar aos amantes da literatura já que o local era frequentado por ninguem menos que Fernando Pessoa e muitos mais outros literatos locais.

Quero lhe chamar a atenção mesmo é para os nomes dados aos endereços e à sonoridades deles. 

As Freguesias - leva o nome de freguesia toda a região de Portugal que tenha uma Camara de Vereadores - de Santos-o-Velho, do Santo Condestável, Beato e a Santa Engrácia. Alfama, Mouraria, Chiado, Baixa Pombalina, A Estrela, Campo Grande e Campo Pequeno, Bairro Azul, da Flamenga, da Cruz Vermelha, Madrágoa, O Rato, Quinta dos Barros - e penso na família de meu pai que leva esse sobrenome - Quinta do Morgado - e quem nunca tomou um Quinta do Morgado que jogue a primeira pedra - Quinta da Cabrinha... ufa! e muitos mais.

Uma cidade portuguesa é composta de suas freguesias e as freguesias por seus bairros. O freguês é o morador da freguesia. 

E olha o charme dos nomes de bairros que lembro agora.

Bairro do Relógio, dos Actores, dos Alfinetes, Galinheiras, Estrela - e nesse bairro tem a Catedral da Estrela que é de uma suntuosidade que arregala aos olhos e que deveria ser de visita imperdível e obrigatória à quem passa por Lisboa - o Príncipe Real - esse famoso por ser o bairro gay da cidade e onde moças e rapazes andam de mãos dadas sem quaisquer medos e constrangimentos ilegais - Rio Seco, onde moro. Tem mais? Tem sim senhor: Arco do Cego, Bairro Azul 

Tem a Travessa do Fala Só, as Escadinhas dos Terramotos, o Beco da Surra, o Jardim das Pichas Murchas - e "picha" por aqui é mesmo aquilo que seu marido carrega entre as pernas, minha senhora! 

E muitos outros de nomes tão bonitos que eu seria capaz de morar num deles só por causa da sonoridade das silabas ou do que o nome representa. 

Um café aqui e outro ali e me vou sem pressa de chegar. E o melhor café do Brasil está em Portugal, sim Senhor. Um clic na Ponte 25 de Abril que já foi Ponte Salazar - e só de falar no nome do ditador o portuga faz o sinal da cruz e treme não sei de odio ou de medo. E poucos são os que ainda fazem o tal sinal por aqui já que o ateísmo está a transformar as igrejas em meros museus.

E nas colunas que sustentam a imponente ponte, só para os olhos mais atentos como os meus, um grafite de Banksy. Quem é Banksy? Misterioso grafiteiro anónimo, que pode ser um individuo ou grupo, que acabou de vender por não sei quantos milhões de dólares, uma de suas obras na famosa casa de leilões Christie´s. Com o dinheiro arrecadado comprou um barco SOS e contratou uma equipe que se dedica a salvar os que se lançam oceano à dentro na tentativa suicida de aqui na Europa chegar. E o barco agora é um problema aos governos europeus que, dos demais continentes, preferem as bananas e diamantes à "essa gente" que preferem que morram afogados a aqui pisar. 

E essa ponte que sai de Lisboa, passa sobre a Freguesia de Alcântara e termina do outro lado do Rio Tejo, na cidade de Almada. E tanto aço foi usado para a contruir que, se um fio fosse feito, duas voltas se dariam dadas ao globo terrestre.

E deixo as freguesias, os bairros e as ruas e termino minha caminhada nessa crónica na ponte que passa sobre esse rio tão grande, que nasce lá na Espanha, passa pelas terras de Don Quixote de La Mancha e seu fiel escudeiro Sancho Pança, entra Portugal à dentro, e que nele cabem centenas de outros rios, mas no meu coração... o Corda e o Mearim. 


Um abraço, conterrâneos barra-cordenses!


Wan Lucena


Boleia = carona

Frigorífico = geladeira

Talho = açougue

Tô = Alô

Percebes = marisco mais esquisito que já vi na face do planeta e que por aqui adoram e que mais parece uma pata de dragão

Picha ou Pila = pénis, "pica"

Pica = injeção  



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