quinta-feira, 3 de maio de 2018

Salada de Gente

De longe se ver o “Skina Brasil”, uma pastelaria de brasileiros - como não poderia deixar de ser - que vende pão de queijo e vaca atolada e que tem por proprietário o mineiro e fumante inveterado Jairo que é irmão da Cida que á dona do Salão de Beleza ao lado e que faz sobrancelha e arranca pelos e pentelhos à base da cera que ela mesma faz. A vaca atolada é boa e o pão de queijo é uma viagem ao Brasil das Gerais. 

Já mais à frente a velha senhora com cara triste e de doença faz arremates, remendos e bainhas nas calças, camisas e vestidos da vizinhança. Do outro lado rua a loja se enfeita de flores de plástico desde a telha até o chão. A senhorinha magra e maquiada com exageros de boneca de feira veste vestido rodado com motivos florais - como não poderia deixar de ser - gigantes e com mangas que parecem mais balões gigantes e calça sapatos vermelhos acolchoados e baixos pra ficar mais confortáveis.

Na rua as ciganas viúvas, para lá e para cá, vestidas de preto até à alma, cobertas por chales e lenços às cabeças, saias que arrastam ao chão e blusas com mangas que cobrem até à metade das mãos e pernas cobertas por meias que se enfiam em qualquer sapato. Tudo, mas tudinho, preto luto fechado e que em muito me lembram as aves de mau agouro de algum filme de Hitchcoch. Creio que essas senhoras dessa cultura - e aqui existem às multidões - torcem pra se tornarem viúvas e vestirem-se desse luto ao qual somente a morte lhes tirará e que levam com orgulho e para fazer inveja ás demais. 

Os sinos da igreja dobram e a cena das carolas portuguesas é de romaria nesse país que se orgulha de ser o mais católico da Europa. Descrever cada uma delas seria exercício que levaria alguns dias. Já na frente da igreja está o Mercado Municipal da Ajuda que não é tão grande, mas que tem gente aos montes e feirantes a gritar: “olha a banana!”. E a banana que consumimos aqui é sempre a mesma. Não tem variedade. A não ser que se busque como quem procura alguma joia perdida. A banana importada da América Central chega aos navios e é distribuída para todo o país.

O velho e histórico “elétrico” - e é só o bondinho que aqui tem aos montes e aos quais os turistas e lisboetas amam - pára e sobem e descem devagar todas as gentes. Mulheres com meninos barulhentos e idosos com bengalas. Ouvem-se vários idiomas e se percebe que a Babilônia é aqui. É primavera e os casais enamorados adoram está sob a luz intensa dessa cidade e na segurança que se goza por aqui. Os asiáticos e suas lojas de eletrônicos chineses vulgares e falsificados. A escola primária com os miúdos no recreio a fazer muito barulho e a atrapalhar a missa das carolas sem que elas reclamem. 

Tudo tão misturado e tudo tão diversificado quanto uma salada colorida em tigela grande e transparente sobre rica mesa. No geral, ouvem-se sorrisos e gritos. Parece que se está a gozar felicidade. Os murmúrios da dor não posso e nem quero ouvi-los.Bastam-me os meus!

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