terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Seremos aquilo que sonharmos

Inicio a minha cronica dessa semana a pedir desculpas ao leitor ante ao fato de que ela pode soar piegas ou coisa de auto ajuda. A minha intenção com o texto é o incentivo e a inspiração àqueles que se encontram presos em suas realidades duras e cruéis. A minha cronica talvez esteja direcionada aos mal nascidos como eu que não tiveram o suporte necessário para o crescimento enquanto ser humano. 

Embora falte o suporte para o crescimento, com luta e superação, com esperança e desejo, podemos nós mesmos chegarmos aonde sonharmos. A questão é que muitos não sonham e se entregam à desesperança. Alguém já declarou que "seremos do tamanho que sonharmos". 

Cada individuo tem a sua própria perceção de felicidade, a meu ver. A minha felicidade consta de viver bem e em segurança. As duas opções continuam recheadas de subjetividade, diria o leitor mais crítico. O que é inseguro para mim pode não ser ao outro e vice-versa. A subjetividade aumenta ainda mais quando consideramos o que seria esse "viver bem". Nesse caso teríamos que levar em conta os desejos de cada um. No meu caso que sou um cosmopolita inveterado, nunca daria conta de viver isolado numa casinha de sapê, às margens de caudaloso riacho mesmo que uma imensa montanha riscasse o céu com as suas linhas. Adoro as paisagens bucólicas para um fim de semana ou em fotografias. Mas para o meu dia a dia preciso de uma padaria na rua que ofereça pão quentinho.

Quando sai de minha cidade Barra do Corda, no Maranhão, depois de três noites sem dormir, com dores de estomago e ansias de vomito ante a ansiedade e o medo do que a vida me reservava na cidade grande - e eu tinha razão já que não foi mesmo fácil chegar até aqui e muitas foram as dores e momentos em que me faltou desde o pó de café ao ombro de um amigo que pudesse apenas me apoiar com uma ou duas palavras de ânimo e solidariedade. 

Quando já em Brasília, poucos meses depois, foi também para lá meu primo, Roselino, o Turita, filho de meu tio Benjamim. Ele ficou por lá não mais que um mês e voltou para Barra do Corda onde se casou e hoje mora na região de Grajau a fazer o que sempre quis. Tem um pedacinho de terra, cabeças de gado pra cuidar e tirar leite, esposa, filhos e netos. É um homem feliz, com certeza. Não suportou viver na cidade grande.

Em Alagoas, quando por lá passei uma temporada difícil, já depois de aposentado, percebia os jovens a fazer nada que não fosse surfar e namorar as raparigas turistas - e rapariga aqui em Portugal é moça, esclareço.  Perguntava-lhes sobre o que esperavam do futuro e eles respondiam com certa indolência maconheira: 

- Não quero outra vida. Aqui que sou feliz. Aqui que vou viver e morrer porque lugar melhor que este no mundo não há!

E quando diziam que "lugar melhor no mundo não havia" eu lhes perguntava qual outro lugar do mundo conheciam e eles, de novo respondiam sem titubear: 

- Conheço tudo pela internet  ou pela televisão e me basta. Aqui nesse praia, nesse povoado, com meus amigos, tomando a minha cervejinha que os outros pagam, com minha família por perto... saio daqui nunca não, viu moço!

E captava essa informação sempre com um misto de desconfianças. Pode ser um acomodado preguiçoso a blefar? Pode sim! Pode ser um apavorado ante a suspeita de que a batalha na cidade grande ou na vida além da sua pequena geografia pode ser por demais difícil e penosa e que o sucesso não é certo? Pode! Pode ser que o individuo esteja mesmo muito é consciente de que não precisa de mais que aquilo de que já dispõe para ser feliz? Pode! Pode ser que não lhe incomode a boca banguela por não ter condições de cuidar dos dentes? Pode! 

Tive lá nas Alagoas uma camareira que do altos dos seus quase 40 anos, casada e com duas filhas moças, me informou certo dia, com tristeza visível, que o local mais longe que fora da sua cidade natal tinha sido a cidade vizinha a apenas 10 kms. 

E eu entendo que a vida, muitas vezes, não nos permite as mesmas oportunidades. Mas também sei, por experiencia própria, que se a porta não nos for aberta por bem, como autoridade que somos de nossas próprias vidas, temos de arrombá-la. E não estou a fazer defesa de violência ou de atos desonestos. Mas acredito que seremos aquilo que sonharmos. Seremos aquilo que desejarmos 24 horas por dia, 365 dias por ano. Há que se mexer, derramar sangue, suor e lágrimas. Há que se romper barreiras e limites. Talvez se deslocar para outra localidade, para uma cidade grande ou para outro país.

Há que se sonhar com um alvo muito bem estabelecido e futuro. O sonho pode se tornar realidade desde que vc opere o milagre que vc está a esperar que deus, o acaso, a sorte ou sei lá o quê, lhe traga.

Mas, nunca mais se voltaremos a sermos quem já fomos. É uma regra da natureza. Entretanto, que amanhã estejamos sempre melhores em tudo.


Wan Lucena


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