domingo, 11 de março de 2018

A Minha Rua

A minha rua não é o que se poderia dizer ser uma ruazinha sem graça.

O Zé faz o café alegremente na pastelaria e Maria João passa roupas por todo o dia na lavanderia. O Felipe é peluqueiro, mas informa em letras garrafais "Apenas para Homens". Já a Sara é cigana que ler mãos ou vende panos de prato. O Chong é chinês e dono da loja de 1 e 99 que leva o nome de "Fura-olho". No mercadinho está a simpática paquistanesa esposa do Billal que cuida das cebolas e das batatas que compro pra o almoço. Tem a Felipa que é dona do Hair Studio, esse só para mulheres e onde não tem manicura. o Abhoil é o indiano de turbante laranja a quase bater no teto e que é dono do Restaurante que emite o cheiro de curry pela rua toda e cuja chaminé está abaixo da minha janela e faz meu estômago roncar e faz os meus budas da minha sala revirarem os olhos de saudade. O rapaz empacotado no terno azul de chama Pedro e trabalha no Banco BPI donde os clientes são, quase todos, de cabeça branca e usam bengalas ou andajás. Tem a loja que vende apetrechos de não sei o quê e donde nunca vi um cliente a comprar o que quer que seja. A Luzía é a dona do ateliê de costuras e faz as barras das minhas calças. O Francisco é o dono da Funerária Boa Hora e tem um "visu" apropriado ao ramo: cabelo preto pintado e engomado, grudado no casco da cabeça em linhas de pente grosso, sobrancelhas longas e que mais parecem tanajuras e um bigode que parece a minha escova de engraxar sapatos. O Simão é Chef e dono do Restaurante açoriano ao pé do mercado municipal. A barriga não nega a fartura e a gulodice e o bigode é de um leão marinho, mas a comida é boa e levou o estabelecimento a ser tido como dos melhores na cidade. Antonio é o padeiro que diz fazer o único pão de verdade daqui e que os demais estabelecimentos, inclusive o Pingo Doce que vende o mais saboroso Carcaça da Aldeia que já comi, não fazem pão de verdade. Seu Pedreira é figura mal humorada e suja que é dono da oficina que deveria consertar os móveis, mas, que, na verdade, emporcalha a cena com os velhos moveis espalhadas calçada à fora e abriga cachorros pulguentos e ratos que de tão grande podem ser confundidos com a anta do Brasil - exagero meu. Aparecida é a moça sem vaidades que cuida da papelaria e que agradece á quem não a fizer levantar-se de sua velha cadeira a lhe atrapalhar a partida de futebol donde o Benfica tem de ganhar todas. o Padre se chama Gonçalo e vive a fugir dos fregueses que lhe cobram não bater o sino da igreja às seis da manhã a acordar quem não lhe é crente. Safira e Aburkarl é casal de árabes não sei de qual país, mas que são donos da Loja da Sorte, a casa lotérica daqui. Abner é judeu e dono de vários apartamentos e vive de alugar ou vender suas propriedades em negócios nos quais nunca leva prejuízo. Itamar é desdentado e rapaz velho e solteiro, cliente 24 horas, que vive na Pastelaria do Zé a beber café, vinho barato e a fumar um cigarro do lado fora mesmo que debaixo de chuva. Zuza é velha cigana enrugada e vestida de preto breu dos pés cabeça ante o luto da viuvês orgulhosa do marido que morreu faz mais de quarenta anos - É a nossa cultura - informou-me ela no que pretendia ser altiva mas denotou-me, de verdade, a submissão ao machismo burro. 

E tem muitos mais aos quais poderia citar em apenas algumas palavras que formariam frase em texto de páginas que dariam um livro e que, com certeza, lhe cansariam.

Mas, a minha rua não é o que se poderia dizer ser uma ruazinha sem graça. 

2 comentários:

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