sexta-feira, 27 de abril de 2012

SAMURAI, O BÍGAMO DE ITACARÉ.

Depois de passar toda a manhã na Praia de Itacarezinho, para meu deleite, quase deserta na baixa temporada, fui à orla de Itacaré, propriamente dita, atrás de um peixe fresco para me alimentar. Passava de carro, vagarosamente, quase em ritmo baiano, observando os muitos quiosques para escolher um que me apetecesse parar quando um rapaz baixinho, franzino, de chapéu de palha com abas grandes e esfarrapadas, acenava mostrando-me o cardápio. 

Parei o carro e ele me convenceu, simpático, a almoçar no seu quiosque. Sentei-me na cadeira de plástico em frente à praia da Concha. Poucos turistas e muita paz. Uma cerveja, porque ninguém é de ferro. A barraca estava vazia ante a falta de turismo da baixa temporada. Sobra tempo para que os garçons possam nos atender como se VIP's fôssemos. E o melhor... jogar conversa fora. 

- Qual o seu nome? - perguntei ao rapaz franzino que me fez entrar no quiosque.

- Jason - me respondeu.

- Deve ser algum apelido de novo - pensei logo.

Mas, o nome do rapaz era mesmo Jason e, ao contrário do personagem do filme de terror, este Jason era totalmente da paz. 

- Nunca matei ninguém - me afirmou ele - mas, acho que foi a única coisa que não fiz nesta vida - complementou abrindo o sorriso.

Disse que sua estória daria para escrever um livro. Que era baiano de Trancoso e filho de arquiteta e engenheiro, portanto, tinha berço. Mas escolhera aquela vida de desapego. Já conhecera o Brasil quase todo e que já dormira na rua. Que magreza era fruto da fome mesmo. Renegou a vida confortável com os pais para viver pelo mundo, desapegadamente. Casado, a mulher estava grávida de nove meses. 

O pedido foi feito e passou a nos atender um outro garçom, tão franzino quanto Jason.

- Qual o seu nome - perguntei a ele certo de que iria ouvir como resposta um apelido.

- Samurai. Pode me chamar de Samurai - respondeu ele com voz empostada de locutor e gesto de quem estava no palco a se apresentar para platéia exigente.

- Mas estória mesmo quem tem pra contar é ele - informou-me Jason a apontar seu amigo Samurai.

Samurai era mesmo o apelido de Klebson. Sim, o nome de Samurai era Klebson. Era ele amigo de Jason e ambos chegaram quase que ao mesmo tempo em Itacaré. Os dois eram companheiros de aventuras e desventuras. Onde um vai, o outro vai atrás. 

- Ele é casado com duas mulheres. As duas vivem sob o mesmo teto - disse-me Jason a falar de Samurai.

Minha curiosidade aguçou-se e, com receio de está incomodando ou sendo invasivo, comecei a perguntar detalhes do triângulo amoroso a que estava submetido o sortudo - ou azarado - Samurai de Itacaré.

Estava ele casado há mais de dez anos e já com três filhos quando se envolveu com a melhor amiga da esposa que estava hospedada em sua casa. A até então amante, incomodada com a traição e que rolava já a algum tempo sob o teto e bigodes da amiga, a chamou para uma conversa e contou-lhe tudo. Disse que fora traída, ela própria, por seus sentimentos. Que estava apaixonada pelo marido dela e que iria embora dali a três dias no máximo.  A esposa de Samurai ficou estupefacta com a traição. A conversa, no entanto, rolou em nível cordial.

Samurai não sabia o que fazer. Estava ele apaixonado pela amante e amava a esposa da mesma forma. Mas nada podia fazer. A amante tinha mesmo de ir-se de sua casa. Seu coração estava despedaçado ante a perda. Mas, nada comentou com a esposa e ela não lhe procurou para qualquer conversa ou cobrança ante seu comportamento reprovável em nossa cultura.

Já de malas prontas, a amante estava para ir-se quando foi procurada pela esposa de Samurai que lhe confessou está muito incomodada. Incomodada não pela traição, mas, pelo fato de está perdendo uma amiga. 

Samurai quase não acreditou quando a esposa lhe informou que a amiga não mais iria embora e que ambas haviam entrado em acordo que seria bom para todos. Ambas morariam com ele, debaixo do mesmo teto, porém, em quartos separados. Ele teria de assistir ás duas igualmente. A paz voltou a reinar do grande coração de Samurai. 

Neste momento a segunda esposa e ex-amante de Samurai está grávida. Samurai é mesmo um guerreiro oriental. Quiçá, um felizardo que dispõe, em perfeita harmonia, de duas gueixas que lhe estão sempre prontas a servir. 

- Muitas outras estórias nós poderíamos lhe contar, mas o tempo não nos permite - me informou Jason e mandou que Samurai fosse atender a mesa em lado oposto ao meu.

Eu ficaria ali a tarde toda ouvindo as muitas estórias dessas duas criaturas tão ricas e desapegadas. Mas, só pensava em vir para a pousada e escrever esta crônica. E foi o que fiz! 

Wanderley Lucena





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