segunda-feira, 23 de abril de 2012

JAÍZA, A HIPOCONDRÍACA DO MARINA PALACE

Jaíza é, talvez, a pessoa mais espirituosa que já conheci. Está em sua companhia é garantia de risadas abertas, de se ficar sem o fôlego com suas "tiradas" inteligentes e humor sarcástico, apurado, inteligente.  Característica que alguns viventes, muito de vez em quando, são agraciados por alguma fada madrinha que abençoa com algum talento único. Ocorre que ela, além de ser tudo isso, acompanha-lhe um destabalhoamento que, na verdade, é tempero único de uma personalidade interessantíssima. Certo é que a minha Jaíza não traz prejuízos a ninguém com seu estilo, muito pelo contrário, embeleza a roda de amigos e faz todo mundo não querer ir embora.

Minha amiga Jaíza hospedou-se no Marina Palace, hotel cinco estrelas do Leblon, depois de ter feito a reserva e achar que ia lavar a égua aproveitando-se das mordomias que o dito hotel dispensa aos seus seletos hóspedes. Ocorre que o luxo todo foi virando inferno quando, na hora de cair nos braços de Morfeu, em lençóis de fio egípcio, descobriu ela que o andar quase todo estava em reforma. Martelos, britadeiras, esmeris, furadeiras, etc... era o que se ouvia. Nada do silêncio dos justos ao qual merecia Jaiza.

Jaíza tomou suas gotas dobradas de rivotril, colocou tampões aos ouvidos, enfiou-se debaixo do poderoso edredom e... nada. Possessa ela ligou para a recepção.

- Moço aqui é a hóspede da suite 402. Ocorre que não consigo dormir com todo o barulho da reforma à qual não fui informada quando fiz a reserva - reclamou ela indignada e tentando manter a pose.

- Nada podemos fazer, minha Senhora! - Foi a resposta do funcionário.

- Escuta aqui moço, o Senhor não sabe quem eu sou! - Respondeu ela, receosa que ele procurasse saber quem era ela.

Mas foi com voz de madame indignada que lhe falou. E Jaíza é mesmo mulher fina, mas, até onde eu sei, não tem o sobrenome Matarazzo na sua identidade.

- A senhora trabalha com o quê? - perguntou o insolente funcionário.

- Eu sou rica, meu Senhor! - disse ela tentando segurar o sorriso descontrolado - ...e minha Carteira Profissional é meu cartão de crédito! - complementou.

E Jaíza não quis mesmo humilhar o funcionário. Era apenas a sua espirituosidade aflorada que a fazia agir como se personagem nelsonrodriguiana.

- Um momento, Senhora! - Pediu o funcionário mudando o tom da voz.

Algum tempo depois o telefone tocou.

- Senhora, colocamos à sua disposição e de seu esposo, a suite presidencial de nossa outra unidade hoteleira. Sentimos pelo transtorno e esperamos ter compensado o aborrecimento.

Jaíza não acreditava. Disponibilizaram-lhe a suite destinada aos presidentes, príncipes, etc... e aos Matarazzo. Saltitou incontrolavelmente e  soltou um grito que deixaria o Hitchcock assustado. Sua felicidade não cabia em si. Depois de um jantar romântico com o maridão, dormiu como se rainha fosse.

Mas o marido levantara-se mui cedo para cuidar de encontros de negócios. Jaíza ainda sob o efeito do rivotril, ouviu seu marido dizer-lhe algo incompreensível e colocar-lhe à palma da mão, algo que ela pensou ser algum dos seus comprimidos que tomava para a enchaqueca crônica. Jogou-o de um golpe à boca e o engoliu. O troço desceu seco, rasgando-lhe a garganta. Ela passou a mão ao copo d'água que se encontrava no criado mudo e tomou-o quase todo.

Já de tarde quando o marido a encontrou na piscina e perguntou-lhe se estava bem. Ela respondeu-lhe que a maldita enxaqueca não aparecera até aquele momento, Que tal fato só podia se dever ao comprimido que ele lhe dera antes de sair da suite. 

- Que comprimido? - Perguntou ele boquiaberto - não te dei nenhum comprimido.

- Como assim? - Indagou ela curiosa e já na certeza que era mais uma das suas loucuras.

- Coloquei em sua mão o botão da blusa que você usou no jantar e que encontrei solto, caído no tapete.

- Jesus! Engoli o botão achando que era comprimido. Mas funciona pra enxaqueca! - Asseverou ela em tom debochado. O que se ouviu foram as gargalhadas soltas que só ela  sabe dá.

Esqueci de perguntar à minha amiga se recuperou ela o bendito botão que cura enxaquecas. Mas, d'outra feita perguntarei.

Wanderley Lucena






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