quinta-feira, 21 de abril de 2016

Imagem e Reflexo

Faço-me de rogado e rejeito elogios que, acredito, sejam verdadeiros e oriundos de pessoas que me querem bem. Ouço e ruborizo. É inevitável o exercício da modéstia. Mas, ali no fundo de mim, está - justo ela - a falsa modéstia. E pareço querer convencer-me que me tornei quem eu sempre quis ser: uma pessoa interessante.

Ao longo de minha vida tive os que me bajulavam por está eu em posição de oferecer-lhes algo em troca, mesmo que fora o simples fato de gostar-lhes ao ponto de tratar-lhes como íntimos ou de não exigir-lhes com a mesma veemência que aos demais os deveres que lhes eram inerentes. Não que eu tenha sido poderoso ou rico. Mas, exerci algumas chefias e posições de destaque e tive subalternos, chefiados e empregados. A bajulação equivocada era evidente. Equivocada por saber eu ser apenas um engodo.

Hoje percebo as manifestações de apreço e carinho e ante ao fato de já não ocupar qualquer cadeira de destaque ou poder, imagino que são tais manifestações pura gratuidade. E fico a me perguntar se sou o que me informam. Faz bem ao ego e aos dentes. O bom é que os elogios  vêm de quem considerei e considero figura inteligentes, por vezes, até importantes socialmente, e que seriam incapazes de bajulações interesseiras ou mentirosas. Pois bem! Eu sempre lhes aviso: não alimentem o monstro! 

Lembro dos tempos idos quando tanto quis ser amigo ou próximo de algumas pessoas e a minha simples aproximação à roda era rejeitada e rechaçada. Agora cuido-me de manter o número de amigos na mesma quantidade, haja vista, não dar conta de atender a todos que me querem. Como diria alguém: tá podendo, heim! Eu vejo pessoas a se movimentar em minha direção e a querer minha atenção e eu, embora, lhes seja gentil, sei que não será alguém que fará parte do meu rol de amigos. E não é por ser pedante, mas, pelo simples fato de que amizade requer tempo e atenção. Tempo eu até tenho, mas, em alguns casos, falta-me a atenção. 

Em casa, me olho no espelho e não vejo o vêem. O espelho mente? Eu e minha auto-estima baixa não me permitem ver e reconhecer na imagem refletida do espelho a minha real estatura? Eu eu enganado a meu respeito? Estariam eles enganados a meu respeito? Tenho medo do dia em ache que me reconheça verdadeiramente ante o espelho. Que tal dia nunca chegue. Acho idiota a soberba e intragável que "se acha" demais. Não quero me achar. Acho mesmo que não o que procurar ou a ser achado. Eu sou o que não vejo. Vejo o que não sou. Sabe-se lá!

E sei que escrever sobre mim mesmo pode ser antagônico ao argumento que utilizo, mas, se o faço é por pura inquietude. Está latente em mim a felicidade de ser querido e a rejeição ao fato de ser querido.

Wanderley Lucena

quarta-feira, 20 de abril de 2016

Desfrute e Deleite

Vivo a me assustar com trupicos e tropeções. Qualquer valeta me faz pisar em falso e me desequilibro. Por enquanto chega a ser divertido. Rio com a insegurança de minhas pernas ante os degraus da escada. É mesmo inevitável a distração ante a cena do quotidiano de cidade agitada na qual vivo. Ademais, tem o celular e o maldito watssap que me faz ficar a teclar ou a ler mensagens, mesmo que me deslocando à pé. E quando o sol está aberto, à pino, fica ainda mais complicado. A tela, praticamente, desaparece e fico a insistir em ver o que me chegou. Sem que perceba a calçada se acaba e há um degrau. Um poste me aparece de repente e bem no meio da cara. Um susto e me recomponho. 

E sei que é porque se me chega a velhice. Não é apenas descuido ou desatenção. Não é acidente puro e simples. Até porque sinto o peso quando vou tomar banho. Há um medo de cair e de me machucar. Antigamente não existia isso.

Se por enquanto é divertido perceber-me às portas da velhice, sei que chegará o dia e a hora em que a amaldiçoarei. Sei que me quebrarei um osso a qualquer hora. Se for apenas um dedo, vá lá. Mas e se for a cara? Sim, porque já quase acertei em cheio alguns postes fincados no meio das calçadas. Eu sei da minha imprudência. Mas, quem resiste à tentação? Como deixar para ler em casa a mensagem no telefone quando você já a espera com alguma ânsia? 

Pois bem, os dias sobre a terra, segundo consta, são para desfrute e deleite. Não vou antecipar a dor. Que valha apenas o dia de hoje. O amanhã ainda virá e eu espero que ele me seja tão bom quanto este dia que estar a ser muito bem vivido. As dores de hoje eu já as esqueci. Os dissabores não os levarei em conta. Que venha a alegria de viver e que a dor seja apenas a certeza de que se estar vivo.

Wanderley Lucena



sábado, 16 de abril de 2016

O Parque

Já estava a chegar na academia depois de curtir preguiça até quase meio dia quando decidi mudar o programa. O parque imenso e cheio de gente estava logo ali à minha frente. Arranquei a camisa com certo puder, mas, seguro de que devia aproveitar o momento e me expor. O sol brilha para todos, é o clichê, não é? Muita gente expirando saúde e alegria. Pic nic's, aniversários, fotógrafos profissionais com noivas ou debutantes em poses de gosto suspeito, um palhaço a animar a festa e a atentar que passava pela pista de cooper, cães de estimação, crianças a correr, marombeiros, etc...


Depois de uma hora eu cheguei em casa e fui banhar-me quando o telefone tocou. Um grande a migo a me convidar para o almoço. Ótimo! Pensei eu. Socorro é cozinheira de mão cheia e a companhia do casal é verdadeiro deleite. Mas, vesti-me e fui à pé, afinal, a casa deles fica a cerca 800 metros da minha. Fui, de novo, pelo mesmo parque. A respiração meio ofegante e as pernas a informarem que já não sou mais nenhum jovem. Eu que aos 20 anos ouvia o pessoal da minha idade a reclamar das pernas e pensava como seria quando eu tivesse a idade deles. E agora, cá estava eu com a idade imaginada, morto de cansado e sentir as pernas que já não me sustentam tão bem como antigamente. 

Mas, uma cena inusitada quase me tira do chão ao ver num semáforo, correndo por entre os carros parados e a distribuir sacos fechados de balas e doces que eram deixados por sobre o retrovisor dos carros, ninguém mais ninguém menos que um Homem Aranha. Sim, havia um Homem Aranha a vender balas no semáforo. E a fantasia era de primeira qualidade. Cobria-lhe tudo, inclusive os olhos. O Homem Aranha estava ali, em carne e osso. Corri a fotografar a cena e logo um pai pediu para tirar fotos com ele e seu filhinho. Fiquei á pensar: é a crise! Depois: que povo danado esse nosso povo brasileiro.

Eufórico e já suado cheguei à imponente portaria do condomínio de meu amigo e ali estava uma senhorinha que, com certeza, era a faxineira e a substituir o porteiro que deveria estar no almoço. Eu nunca gravei o numero do apartamento do meu porque é só chegar e falar para os porteiros que é para o Augusto e eles já informam o número do apartamento. Mas, a senhorinha humilde sequer sabia quem era Augusto. Eu sabia que podia ser no terceiro ou segundo andar. Pedi licença para ir até o apartamento sem ser anunciado já que eu, a mentir, sabia qual o apartamento. Subi pelo elevador e apertei o segundo andar. A porta era exatamente igual e apertei a campainha e ouvi uma voz feminina gritar lá de dentro:

- Pode entrar. A porta está aberta!

Eu abri a porta e vi alguma coisa diferente nos móveis a partir do corredor. Mas, havia um grande sofá marrom que era igual ao da casa de meus amigos e enchi o peito de alto-confiança e emburaquei casa à dentro. Uma senhora de cabelo vermelho, num corte channel, veio ao meu encontro e eu, idiota que só, pensei:

- Deve ser alguma parenta da dona da casa, minha amiga, a dona da  casa que deve estar em outro aposento.

Eu perguntei pela Socorro, minha amiga e fui informado pela senhora que não conhecia tal pessoa. Fiquei verde e tremi. Eu pedi mil desculpas pela invasão certo da gafe cometida. Mas, agora sabia, o apartamento de meus amigos era no piso à cima, o terceiro andar.

Mas, para concluir tenho que voltar ao assunto anterior, ou seja, a idade e o corpo. O corpo não é mais o mesmo; os músculos podem não mais corresponder como ao 20, mas, a cabeça vai muito bem, obrigado. O raciocínio está atento como jamais esteve. É privilégio chegar aqui. Mas, aos 70? Como estarei? Que venham os anos! E que venham muitas outras situações. 

Wanderley lucena

sábado, 9 de abril de 2016

Sábado

É sábado em minha casa e em minh’alma. É folga para quem trabalha, mas é, também, véspera de domingo. É o último dia da semana e, geralmente, é de pura preguiça, de tomar cerveja com amigos, de caminhada no parque, de churrasco, de piscina. Sábado tem noite que pode ser curtida sem hora de voltar pra casa ante ao fato de que se pode dormir no domingo até a hora que se bem quiser já que é dia de folga.

A noite de sábado é de bebedeira, de sexo, de boate, de caça, de aventura. O sábado é intenso e para fora de si, enquanto que o domingo é dia de missa, de culto, de interiorizar-se. E eu até gosto de umas viagens para dentro de mim, mas, com todo o respeito aos religiosos domingueiros, prefiro fazer isso debaixo de uma árvore ou às margens de caudaloso riacho, ou a andar pelo parque, ou a ouvir uma música enquanto dirijo o meu carro.

Sábado é o dia de quem quiser, é o seu dia, é meu dia e pode até ser o dia do capeta. O sábado é meu, todinho meu, só meu. Eu quero morrer num sábado. Quero morrer depois de um êxtase, de um transe. Quero morrer nas vésperas de um domingo. Quero morrer depois de voltar de uma festa ou durante ela. Prefiro a primeira opção só pra não estragar a festa dos demais. Quero que a festa continue sem mim. Quero morrer depois de jogar-me em minha cama numa madrugada de estrelas e farto de alegria e que seja numa noite de sábado pra domingo. Quem quiser ir ao meu velório que o faça depois da festa e que vá com as olheiras da noite bem vivida e com o hálito do álcool e da esbórnia.

E olha que hoje eu já nem preciso mais tanto assim do sábado, pois, sou um desocupado e tenho o ócio por produção graças à aposentadoria merecida. Mas, no sábado todos vivem, mesmo que inconscientemente, a mesma intenção de propriedade desse dia e só querem se divertir.

Pode até ser o dia de fazer a faxina em casa, mas, ela será feita ao som do U2 e com o volume máximo a estourar as caixas de som e anunciar ao resto da vizinhança que sábado é o meu dia e que é de alegria intensa. A faxina será acompanhada de uma cerveja e a vassoura será a parceira numa dança pagã que antecede a muitos outros atos. Pode ser a visita de um amigo ou da namorada, mas, há a expectativa da noite que começará cedo e terminará com os raios do sol de domingo. Será festa e dança. Noites de encontros enamorados de apaixonados ou de encontros rápidos e furtivos de quem jamais se verá novamente. Encontros elaborados e programados ou intuitivos e repentinos em becos escuros e derivados da atração dos corpos. E a faxina será feliz ante a perspectiva de uma noite intensa de sábado.

Domingo é de descanso do que se fez no sábado. O domingo é o “dia do senhor”. Dia de ficar na desagradável expectativa da segunda-feira. E a segunda-feira é o pior dia da semana. De tão desagradável ele começa já no domingo. Se eu pudesse pararia o tempo ou pularia todas as segundas-feiras e iria direto para a terça-feira. 

Sábado é o dia melhor de todos. E o bom é que ele acontece a cada sete dias. Não é como o aniversário, o réveillon, o feriado prolongado... esses ocorrem uma vez no mês ou ano. Sábado tem 30 horas já que só acaba com o sol de domingo. O domingo fica para o senhor e todas as suas ladainhas, rituais e obrigações enfadonhas. Se o domingo é do senhor, o sábado é todo meu! O sábado é nosso! Vamos para a festa!

Wanderley Lucena

sexta-feira, 8 de abril de 2016

Reencontro

Graças à tecnologia virtual das redes sociais, um amigo ao qual não via fazia mais de 30 anos, manteve contato. Ocorre que não era qualquer amigo, mas, um amigo por demais especial. Quando nos conhecemos no ano de 1984 quando éramos alunos em um curso de regime internato e durou sete meses. 

Foi com surpresa que recebi seu convite de "adicionar" em uma dessas redes sociais. Era o meu velho e bom amigo de outrora que mantinha aquele contato depois de tantos anos. E agora, morando na mesma cidade, marcamos um papo, um "matar a saudade" em um bar charmoso aqui pertinho.

Cheguei antes do horário e fiquei a esperar. Será ele teria dificuldades em me reconhecer depois de tantos anos? Ele chegou e abriu-se em afetuoso abraço. Não fora o cabelo platinado pelo tempo eu diria que ele nada mudara. Não haviam rugas em seu rosto moreno e a expressão era a mesma. Nem a barriga típica das pessoas de nossa idade. O mesmo sorriso, os mesmo gestos. Mas, como não poderia deixar de ser, havia a sobriedade que é a grande vantagem das pessoas amadurecidas. A fala era mansa e o tom ameno das pessoas educadas. E meu amigo sempre foi pessoa admirável nesse quesito. O papo durou cerca de três horas e elas se passaram como se três minutos. 

Ele me contou as suas estórias e eu as minhas. As lembranças que ele tinha de mim, de nós e dele, muitas delas se me haviam me apagado na memória. Mas, consegui reviver e até me lembrar de algumas delas. As lembranças todas eram como o cheiro da murta depois que a chuva cai na terra árida. Já sentiu o cheiro da murta? É frutinha verde, cítrica e sabor indescritível que dar lá pra o sertão, na beira dos caminhos da roça no Maranhão. O cheiro é tão bom que bem podia ser acondicionado em frasco de perfume francês. 

Nosso reencontro foi um reviver, um abrir de baú velho cheio de recordações. Encontrar um amigo ao qual você queria fora também teu irmão é como encontro cósmico ao qual não se pode mensurar. E tenho meu irmão de sangue a quem tanto gosto e quero bem. Mas, o meu amigo ali na minha frente era mais que amigo, era companheiro de estação planetária, estação chamada "terra". Um encontro de almas irmãs. Ficou combinado, de novo, a qualquer momento, nos encontraremos e continuar emos a conversa tão agradável e que não foi suficiente. "Gracias a la vida que me ha dado tanto!".

Wanderley Lucena

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Odores de humanidade

Depois de sentir um mal odor típico da flatulência e dentro do metrô eu fiquei a me perguntar do porquê sermos tão fedidos. O corpo humano precisava de tantos orifícios? Eu sei é aceito a sabedoria da natureza e não reclamar por reclamar, simplesmente. Faço a minha reflexão com certa análise espiritual-filosófica. E seu que é pura ousadia de minha parte, pois, filósofo não o sou. Mas, a mãe natureza precisava no colocar em corpo tão orgânico? Porque o corpo humano precisa produzir tantos gases? Tem o mal hálito, o suor nas axilas, o chulé,  a cera do ouvido, as secreções das partes íntimas, a saliva, a flatulência, o excremento e até o próprio sangue. Meu Deus!

Inventamos o perfume para disfarçar tanto fedor e mesmo assim, por vezes, nem os mais fortes dão conta do recado. Mesmo aqueles que belos fedem tanto quanto qualquer mendigo que não toma banho, basta que fique um ou dois dias em total relaxamento da assepsia corporal. Devemos ser espitritos, creio. Como podemos, enquanto espíritos, seres energéticos, fedor tanto?

Como pode o nosso interior ser tão podre e não conter-se em si é termos de espécie tantas nojeiras que vão desde um simples flato à uma diarréia? Uma boca cheia de cáries e sem escovação pode bem ser comparada a um ânus. Seria mesmo um privilégio a nossa humanidade fétida e em putrefação?

Quem se habilita às respostas? Eu de cá me ponho, mesmo assim, agradecido ante o sol cálido em minha fronte ou de sentir água corrente e fria em menus pés quando os ponho num caldaloso regaço. Ademais, bem sei, existem muitos bons odores na natureza que podem ir desde uma flor à relva molhada ou seca. Mas, a natureza sequer se faz alguma assepsia como nós humanos somos obrigados diariamente e por diversas vezes.

Mas, vale a minha humanidade ainda que fétida. Mas, se pudesse escolher, pediria vir com cheirinho de alguma flor Silvestre que bem poderia ser a lavanda.

Wanderley Lucena

Educação e Estilo

Desde que aqui cheguei chama-me a atenção a quantidade de leitores nos vagões do metrô de Brasilia. Faz-me lembrar a boa impressão que tive no metrô de Buenos Aires quando por lá estive faz alguns anos.  Naquele momento pensei com meus botões no quanto nós estávamos distantes deles, os argentinos. Belíssimos que são e com uma cara de quem entende o mundo de tanto que se educam los hermanos. Mas, já faz algum tempo que lá estive e as coisas podem ter mudado depois da passagem de uma bruxa má chamada Cristina que lhes roubou muito, assim como cá, uma outra bruxa tudo nos roubou, inclusive, a nossa dignidade.

A minha reflexão é pensar que apesar da carência educacional oferecida pelo governo da bruxa má, insistimos em nossa busca pela educação. Vejo as ordas de alunos com suas mochilas pesadas e seus uniformes pobres e surrados a se dirigirem para suas escolas em busca da salvação. Nos vagões vejo muitos a lerem seus livros e que prazer que isso me dá. E agora sei que se não os via era porque não tínhamos o metrô e de ônibus é impossível ler ante os solavancos que faltam nos jogar janela à fora.

Já não sinto mais invejas de "mis queridos hermanos argentinos". Já não nos falta mais nem a beleza. Esse quesito também tem me chamado a atenção positivamente. Somos um povo bonito. E melhor é que somos mesclados. Temos brancos, negros, morenos, índios, galegos, sararás, etc... e já alcançamos bom nível de equilíbrio estético. É lindo ver que sabemos equilibrar as cores e que temos certa elegância no vestir.

Vale lembrar que nem tudo são flores. É triste ver o egoísmo do jovem que se senta no banco reservado e faz de conta que não percebe o idoso a quem deveria dar o lugar. Assim como, perceber que ninguém obedece a ordem de entrada e saída dos vagões e se atropelam uns aos outros ou ver que sentam-se no chão do vagão e se encostam nas portas que abrem e fecham freneticamente. Além do risco que corre quem pratica tal falta de educação, há a questão que impedem a mobilidade de quem deseja entrar ou sair do vagão.

Esta semana, já numa parada de ônibus, um garoto de uns 13 anos, vestindo uniforme de um Centro Educacional, estava sentado sobre o encosto da cadeira e com os pés sobre o assento. Teclava displicente no seu celular. Não resisti e o abordei e cobrei que respeitasse quem iria sentar-se logo após ele. O rapazote, mal saído dos cueiros, resolveu discordar. Chamei-o de mal educado e que deveria recolher-se e ouvir e aprender com os mais velhos. Ele não quis saber e disse que sua educação era cabida a seus pais e somente à eles. Discordei de forma veemente com o incauto e lhe informei que educação é recebida a todo momento e vem de onde menos se espera e que o seu Centro Educacional onde estudava era também responsável por sua educação. Mas, rendi-me ante a surdez daquele menino e conclui que se eu tentasse convencer a um poste de concreto poderia ter mais sucesso. Recolhi-me.

Mas, estamos melhores, creio eu.  

Wanderley Lucena 

A Efusiva

E ela me mandou um agradecimento todo simpático por meio do watssap. Agradecia pela forma como a descrevera em uma de minhas postagens/crônicas. Dizia ela que a havia captado na essência e que nem era merecedora de ser uma das minhas personagens. Eu fiquei a pensar no quanto fazemos a ideia errada da imagem, da nossa auto-imagem. Uns a exageram para mais e outros para menos. Não sei se ela fazia o bom e velho exercício da humildade ou se estava mesmo equivocada quanto à sua estatura de personalidade. Adoro ouvi-la. Efusiva e espirituosa como poucas que conheci. É já uma senhora cinquentona com cara de trinta e que já começa a se incomodar com tal fato. Eu a entendo pois, também, estou eu no mesmo barco.

São tantas as estórias por ela contadas que eu gostaria de ter um gravador ou uma memória de elefante para contá-las todas neste blog. Ela fala alto e dar risadas abertas. Vez por outra é obrigada a se levantar da mesa e ir para a rua para empurrar a maldita nicotina no juízo e nas veias. Acho que jamais acharei alguém tão espirituosa quanto ela.

"Nunca gostei dela mesmo!", tascou ela em uma de suas tiradas enquanto se matava a puxar a fumaça nicotinada do cigarro e entupir os pulmões. Eu não sei exatamente a quem ela se referia por ter apontado com um gesto de cabeça discreto em direção à uma das senhoras da mesa.  Mas, parecia ser de uma parenta com quem teve alguma desafeição quanto esteve com problemas de saúde e não foi por ela assistida. Mas, ela nunca foi de perder tempo a declarar suas decepções. Sempre em alto astral e alegre, diria eu, quase doida. Adoro gente doida. Aquele doido do bem, sabe? Aquele que se desprendeu dos conceitos sociais ou que jamais se prendeu à eles.

Naquele mesmo dia enviou, via grupo de watssap, uma foto dela própria vestida em um belo modelo prateado de algum modelista francês e que, creio, deve ter comprado por lá mesmo, por Paris. O grupo, atencioso e gentil, comentou de sua beleza e elegância, mas, se pronunciou quanto ao vestido que bem podia ser usado no tapete vermelho do Oscar. Ela não se fez de rogada e exigiu os comentários a respeito do vestido. Pois bem, esse é o estilo dela. É autêntica e sagaz.

Ela é atabalhoada e fala feito papagaio. A sua ânsia para contar suas estórias é tanta que, por vezes, não adianta. Todos têm de calar-se, rendidos a ouvi-la. Enquanto conta suas estória tem crises de risos contaminantes e todos faltam morrer, junto com ela, ante a esteria. É mesmo uma dessas figuras às quais eu passaria horas, talvez dias, sem abusar de ouvir.

Ela é uma espécie de carro alegórico que se anuncia já lá esquina e que se senta à mesa e todos sabem que a atmosfera mudou. E mudou para melhor! Um prazer ouvir gente que nem ela! Mas, pare de fumar, viu?

Wanderley Lucena