quinta-feira, 16 de abril de 2015

SOBRIEDADE

Ando mais devagar. Desacelerei! Estou menos apreensivo e a impulsão já se faz retardada. Há uma calmaria. Atitude contemplativa ante a natureza e, acima de tudo, agradecida por tudo, inclusive, pelo ar que ainda respiro. Todas as marcas que levo, eu sei, são doloridas, porém, escancaram-me minha própria história como um quadro na parede, pintado por um surrealista. Não me envergonho de nenhuma delas. Se são profundas e na alma ou mesmo aquela que veja ao olhar o espelho e que me tocou a própria carne... não importa. São, igualmente, ricas para mim.

Sobriedade é a estampa que me cobre ao menos por enquanto. Minhas malas levam menos bagagem, porém, sinto-me mais rico. Levo uma visão que vai mais além. O meu horizonte é mais distante. A paisagem tem menos componentes. Entenda-se, porém, que a paisagem não é, nem de longe, menos bonita. Insiro-me sozinho por pura vontade nessa pintura que eu mesmo crio. É bom está aqui. É bom saber que não mais estarei. É bom saber que continuarei minha jornada. Desta vez, em busca de tão pouco. A busca é apenas pela caminhada. Não busco nada além.

Wanderley Lucena

quarta-feira, 1 de abril de 2015

A JORNADA PARA SHANGRI-LA

A minha angustia ante o que não sou é enorme. Estou onde quis está. Estou onde não quero está. E sei que me vou e que, quando lá chegar, igualmente, não me contentarei. E fico a me perguntar dessa prisão corpórea que me leva quase à insanidade. A insatisfação desde que me entendo por gente. Essa ambiguidade latente da existência humana que me corrói as entranhas e me leva a desejar está onde não estou. E que lá estando, logo quererei está em outro lugar. Qual a resposta para tanto incômodo se a simples existência já, por si só, dadiva de Deus?

O discurso da crença da paz interior que tanto pregam as religiões não mais me basta. É bem verdade que, o equilíbrio do nirvana pregado pelo budismo e alguns outros ramos esotéricos, quase me convence. Entretanto, o nirvana implica trabalho hercúleo e disciplina de monge. Não sei se almejo o fim com tantos meios.

De um lado há a certeza de ter feito muita asneira, muitos erros cometidos na jornada. Por outro lado, há uma voz que me sussurra baixinho, suave e melosa: você viveu! você nem errou tanto! Você tentou, e tentar, por si só, já vale á pena! Se tivesse tentado haveria dor maior, a da covardia! 

Em breve, muito breve, me dedicarei a jornada espiritual. E, de já, a angustia me consome. Poderia ser tão simples: basta escolher. Já escolhi. Mas, e os que te desejam a presença? Aqueles aos quais se está atado por relações amorosas ou de contrato? E os parentes que cá ficarão? Uma decisão já tomada e a angustia do que virá.

Vou em busca da minha Shagri-lah!

Mas, parece que já está gravado no meu código genético. Tenho de ir!

Wanderley Lucena