quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

CALOR, ANDROPAUSA E SÃO PEDRO

Ontem achei o dia, por demais, quente e abafado. Entretanto, hoje, parece ainda mais quente. É verdade que corre um vento fresco que, no entanto, não consegue me tirar a sensação de que estou dentro de uma cuscuzeira. Suei como uma chaleira ao fazer meus exercícios físicos do dia. O ar-condicionado, tampouco, dava conta de dissipar o calor na academia.  

A meteorologia informou, ainda, na data de ontem, que uma chuva torrencial iria cair sobre o centro oeste. Esperei a olhar o céu com constância ansiosa. Uma nuvem aqui, outra ali, mas, nada que pudesse parecer o dilúvio anunciado pela meteorologia. Até agora, nenhuma gota quis dignar-se a precipitar-se sobre o planalto central. 

Resta-me entrar para debaixo do chuveiro e tomar um banho frio atrás do outro. E mais: todos os ventiladores estão ligados e uma moleza, uma malemolência do cão, me fez passar a tarde inteira dentro do meu quarto. Penso que pode ser a tal da andropausa, a versão masculina da menopausa. Pode até ser, mas, ouço todo mundo a reclamar do calor infernal que faz por esses dias. 

Tomara que tenha um computador no céu e que São Pedro, num desses acasos que ocorrem a desocupados como eu, numa busca no google, passe pelo meu blog e leia esta crônica e, com a benevolência que lhe é inerente, abra as torneiras do céu e me conceda uma chuva daquelas de molhar os regos. Tomara que ela caia durante a noite e que os pingos sejam enormes e que me acordem do meu sono. Que o vento fresco e úmido entre pelas janelas e, com as cortinas a balançar, levem todo esse calor que me sufoca o corpo e o ambiente.

Wanderley Lucena

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

ACABOU O CARNAVAL

Hoje fui malhar como de costume. Dei de cara com a academia fechada. É quarta-feira de cinzas e a ressaca institucionalizada manda que os afazeres e obrigações comecem depois do meio-dia. Eu havia me esquecido disso. Voltei para minha casa com a certeza de ser mesmo um privilégio nascer em país tão festeiro. Qualquer tropeção por aqui é motivo de baile. É festa demais. Parece que ninguém tem contas a pagar, filhos pra criar, esposa ciumenta, etc... A obrigação é travestir-se em fantasia e viver, em mundo de maravilhas, a  ilusão ser de rei, palhaço, Arlequim ou Colombina.

Os dentes podem está careados, pode ser que nem mais tenha dentes na boca, mas o sorriso, sempre aberto, é sincero. É o sorriso da satisfação, do êxtase. E quanta gente desdentada nas baterias das escolas de samba!  E são eles que a câmera faz questão de pegar em close. O puxador do samba leva cordões e pulseiras douradas - provavelmente aquilo é ouro - mas  o sorriso... uma imensa banguela a cuspir no repórter que, sem guarda-chuvas para proteger-se, mantinha a devida distancia com o braço estirado ao levar o microfone até o entrevistado.

Não importam as contas a pagar. Importa é brincar. E que coisa linda que vira o Brasil continental, todo colorido, todo sorrisos - banguelas ou não - a brincar o carnaval. E atrás do bloco "só não vai quem já morreu".

Pena que sempre chega a quarta-feira de cinzas e leva tudo. É esperar o próximo carnaval. Agora é realidade de novo e... meus Deus! Quantas contas a pagar! Quero que seja carnaval o ano todo. Tem jeito?

Wanderley Lucena

O DESPREZO

"Se sofri ou se chorei... o importante é que emoções eu vivi". É a letra de uma bela música do nosso cancioneiro brasileiro. Entretanto, já virei as costas a algumas pessoas e, confesso... nunca me arrependi de ter-lhes demonstrado o meu desprezo. Tem gente que me mandaria rezar, e eu sei que o que eles gostariam mesmo, era me dizer: "você precisa é evoluir espirititualmente". E cá fico a pensar: "tu também serias capaz da mesma atitude". Não que o desprezo deva virar atitude corriqueira, mas, em algumas situações é ele, o desprezo, a única forma de se ser ouvido. E não sou Jesus Cristo para ser sacrificado em total renúncia de minha auto-defesa. É claro que é atitude extremada; rachadura, geralmente, sem conserto. E ai... me desapego e esqueço. Se volto a lembrar-me, sinto logo o rancor e depois, o luto da perda de quem me morreu em vida. Mas um banho de sal grosso eu faço questão de tomar vez em quando.

Wanderley Lucena

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

A PREGUIÇA


Meu dia deveria começar às nove horas, como sempre. Entretanto, quando levantei e liguei a tv, a reapresentação do Bom dia Brasil, na Globonews, já tinha acabado. Passavam das dez horas. Tomei meu café numa preguiça monumental. Tomei um banho para tirar a inhaca e me preparei para a academia. Já descia as escadas quando me senti travado. Meu corpo pedia para ficar em casa, a fazer quase nada. Obedeci o comando da carne e cá estou, sentado a ver a horas passarem, se não na total inércia porque escrevo isto.

Mas é que por vezes me deixo levar pela preguiça. E tal atitude, no momento em que me encontro, aposentado, não me traz grandes prejuízos. Não tenho mais a obrigação de cumprir horários à risca como quem ainda está na ativa. E não foram poucas as vezes em que a obrigação me fez acordar na madrugada para cumprir o horário, para "bater ponto" no trabalho.  

O cheiro dos temperos que vêm da cozinha me chegam às narinas e me despertam o apetite. É sexta-feira de carnaval. Vou cair na folia. Queimarei as calorias nos blocos a dançar as "marchinhas".

Ceder, ao menos de vez em quando, ao desejo de fazer nada é privilégio que disponho.

Wanderley Lucena

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

A DIARISTA

Minha diarista compareceu depois das 10 horas, quase 11 na verdade. Como sempre, se fez acompanhar de sua bebê que, agora, já está com seis meses. Quando estava com apenas um mês de nascida, o raparigueiro do pai trocou sua mãe por uma mulher de reputação bastante duvidosa. Depois de esfregar a amante na cara da esposa, inclusive, levando-a, orgulhosamente, à igreja da qual eram membros, espalhou à comunidade que trocou a esposa pela amante por ser ela frígida, ruim de cama, o que segundo me afirmou ela própria, trata-se de tremenda infâmia e calúnia. 

O "filho-da-mãe" se dizia "pastor evangélico". Eita profissão sem credibilidade essa! Qualquer um se intitula "pastor". Que me perdoem os verdadeiros pastores que, embora, sejam uma minoria quase extinta, ainda existem aqui ou acolá. Meu Deus! O dito cujus era ex-drogado, ex-presidiário e outros ex mais e etc... e tal... mesmo assim, como tantos outros, foi nomeado "pastor". Neste momento, conforme me contou ela, o endiabrado está, de novo, entregue ao crack, depois de a amante tê-lo largado à própria sorte, quiçá, por frigidez dele ou por ter dote pouco avantajado. Entretanto, em nossa conversa, não fiquei sabendo dos pormenores anatômicos de tão reles indivíduo. 

Ainda bem que minha diarista decidiu viver. Danou a tomar a sua cervejinha e se recusa a botar os pés naquela "igreja". A "pastora" da sua "igreja" insiste em fazer-lhe "visitinhas" diariamente nas quais sempre lhe informa que ela irá queimar no inferno e lá, assim como tantos outros condenados por terem sido "felizes", ela tomará banho eterno em tacho de azeite fervente. E as tais pragas vêm depois de ter, a pastora, confidenciado à minha diarista, que "deitou-se", "coabitou" - no sentido bíblico - com o ex-marido quando ele lhe fez uma visita descompromissada. Detalhe: ele já tem outra família e pertence à mesma igreja, inclusive, como a tal pastora, ocupa cargo de liderança. Mas a tal pastora alegou ser humana, pecadora, falível. Que caiu na tentação sim, mas, que somente Deus poderia julgá-la. No entanto, se acha a pastora, no direito de jogar minha diarista no inferno porque não quer mais saber daquela igreja. 

Foi-se minha diarista curtir o carnaval de Barreiras na Bahia.  

- Isto aqui é para você pagar o motel, no caso de o "folião" não ser tão cavalheiro ou se ele estiver desprovido - lhe informei depois de entregar-lhe uma boa gorjeta.

Agora... refletindo: se no inferno estão aqueles que foram felizes e no céu estarão pessoas como a pastora e o ex-marido de minha diarista, o Edir, o Rodocralho, o Estevan, o Malamáfia  etc.. o inferno termina por ser melhor opção. Você não acha?

Wanderley Lucena


terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

A CULPA DO IMPULSO

Raras vezes não me arrependi dos meus impulsos. Ou será que, sempre, agimos por impulso? Toda e qualquer ação seria resultado de algum impulso. Será? Somente quando nos marcam negativamente é que nos arrependemos e nos martirizamos em nossa consciência que nos acusa como se houvéssemos cometido pecado, quiçá, mortal. O tal passo que foi dado para trás é prejuízo do qual insistimos em cobrar-nos. Não nos perdoamos por termos nos causado o dano. E sabe... esse auto-martírio vira vício dos mais difíceis de se abandonar. A culpa também vira também impulso compulsivo. 

Wanderley Lucena

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

O AMOR DE ONTEM

"Y el amor no nos refleja como ayer"- E o amor já não nos reflete como ontem. Mercedes Sosa. O amor muda com o tempo. Já não nos arremete como catapulta rumo ao infinito desconhecido fazendo com que nosso juízo, como pena no meio redemoinho, fique rodopiando sem parar. Ele, o amor, se manifesta, entretanto, de forma mais lânguida e menos pueril do que na juventude. Não sei qual das duas fases é melhor ou pior. Nesta altura da vida já entendi que o amor não é luta, não é labuta, não é disputa. O amor não tira a paz nem se enciuma. O amor é encaixe perfeito de peças-coração. Quebra-cabeça de apenas duas peças - ou mais. A busca da peça certa é, por vezes, tarefa hercúlea, verdadeira odisseia de Ulisses. Muitos se esforçam a vida toda por encontrá-la e jamais a encontram. Outros, sem muito esforço, se entrelaçam logo no inicio de suas vidas. Mas que sorte tem quem encontra a peça certa. Que sorte tem quem ama!  

Wanderley Lucena

UM ABACAXI POR ENFEITE

As argolas enormes, em plástico branco, nas orelhas do rapaz me fizeram lembrar o feioso índio Raoni. O buraco era tão grande que eu podia ver, por entre eles, o ônibus do outro lado rua. E o Raoni é mesmo muito feio. Mas o moço não o era. Ele era até bonito. É que em sua ânsia por fazer-se perceber, enfeitou-se demais. O rapaz tinha uma enorme tatoo que ia desde a cintura até o pescoço. A cor berrante da tatoo saltava aos olhos de quem queria e de quem não queria ver.

Ele fazia questão de mostrar corpanzil ao despir-se da cintura para cima em toda e qualquer hora, por mais inadequada que fosse a  ocasião. E, mais: um corte moicano que lhe dava a aparência de periquito australiano. O pior mesmo, o indefectível, era a cueca que fora, propositadamente, puxada para cima , rumo ao umbigo, enquanto a calça caia, desleixadamente, mas de propósito, bunda abaixo. O cós da dita cueca era por demais largo e a marca - diga-se - barata, estampada em vermelho urucum, pretendia provocar a lascívia de quem olhava. O rapaz rebolava freneticamente em dança sensual que deixaria qualquer loira do "tcham" boquiaberta. O pior é que, por mais que tentasse, não conseguia deixar de notar, muito negativamente, toda a pavonice daquele moço.

- Mas, a beleza está nos olhos de quem ver - pode me advertir você.

- Francamente! - lhe responderia eu.

Ouvi dizer, e concordo, que muita informação visual pode não ser uma boa a quem pretende a elegância. A elegância é equilíbrio discreto e harmônico. Mas os moços têm o direito de querer ser atraentes e de não passarem desapercebidos. E têm até o direito de errar. Entretanto, chega uma hora na vida em que não se pode mais errar. Ou que, pelo menos, não se deveria. É que a coisa fica ridícula. Aos homens maduros não fica bonito agirem como adolescentes ou crianças e virse-versa.

Todos podem, e devem, se enfeitar. A natureza toda é assim. Exemplo é o galo-de-campina e sua crista; o pavão e sua calda; a ave-do-paraíso e suas cores exuberantes; o leão e sua juba, etc... Embora o homem também goste dos enfeites, somos o único ramo do reino animal considerado "racional". E o que nos difere dos irracionais é, justamente, a nossa capacidade de domínio sobre os nossos instintos. É o "quero, mas não posso"; "posso, mas não devo"; "posso, mas não quero". É que tudo demais é "desequilíbrio". 

E a discrição é tão chique. A discrição nunca é sinônimo de desequilíbrio. Ser notado no meio da multidão, apenas e tão somente, por se ser quem se é. Não por causa do abacaxi que se leva à cabeça. A pavonice é considerada breguice pavorosa em várias situações, exceto, no carnaval. Mas, como diz um amigo meu: "quem paga a conta sou eu, portanto..."  E eu que não pago a conta tento conter-me em meus "instintos" de sinceridade e informar em leras garrafais "você está brega". Até porque a tal racionalidade me informa que sinceridade demais é breguice igual à de quem bota o abacaxi na cabeça e sai por ai dizendo ser galo-de-briga.

E, no fim, todos somos, em algum momento, bregas mesmo. Olha eu aqui escrevendo sobre isto... quer coisa mais brega?

Wanderley Lucena