domingo, 1 de janeiro de 2012

A JOIA


Sentado na cadeira do jardim e vendo os fogos a explodir e a ouvir a contagem regressiva que anunciava a entrada no novo ano na confortável casa de um amigo aos arredores da cidade, ouvi a curiosa estória de um dos participantes da festa. 

Gabriel chegou sem a camiseta branca, bordada de azul celeste, que todos usavam. Justificou-se alegando falta de tempo. É acabara de chegar da cidade de Rondón, no interior do Pará, cidade na qual é o Juiz de Direito local.

Mas surpreendeu-me o otimismo do jovem juiz ao contar-nos de suas agruras, venturas e desventuras pelos rincóns deste país continental. Embora tenha de andar em carro blindado; de está ameaçado de morte por aqueles que pôs na cadeia e da perseguição de alguns poderosos políticos locais que o tem por "pedra no sapato" ao não permitir-lhes o enriquecimento ilícito às custas do mandato. O jovem juiz mantém, não só a ética rígida, mas o otimismo ante a esperança de que a sociedade pode ser melhor. Seu rosto se irradiou ao falar-nos de seus projetos sociais com os estudantes do município. 

Mas a estória que me contou e que passo a contar-vos, não se passou em Rondón, mas aqui mesmo na capital federal.  Gabriel enamorou-se de um belíssimo relógio que vira na vitrine de uma joalheria, diga-se, das mais caras. Não só a joalheria era das mais caras, mas o relógio... de tão caro, compraria, facilmente, uma casa confortável ou um carro que não fosse de modelo popular. Entrou na loja e comprou o bem que foi parcelado em seis vezes. Cada parcela ultrapassava o meu salário mensal - e nem acho que ganho mal.

O relógio impressionava. Cravado de pedras preciosas que iam desde diamantes, jades, ágatas e outras. Ele o usava, garboso, em ocasiões especiais. E era mesmo envaidecido que declarava o valor da joia. E foi assim que foi invejado por alguns pobres de espírito. Outros, invejavam não só o bem, mas o cargo que dava a Gabriel tal poder de compra.

Mas, ele tinha um amigo de muitos anos que, depois de saber da sua aquisição e aproveitando-se da morte de  ente querido, fez-lhe uma visita alegando confortá-lo naquele momento de dor. O amigo não compareceu sozinho. Fez-se acompanhar de um desconhecido que lhe foi apresentado naquele momento. A joia estava muito bem guardada, porém, em local ao qual o amigo já sabia. Depois de muito insistir para que saíssem a se divertir, Gabriel se deixou convencer e aceitou a sugestão. Entretanto, teria de tomar banho antes de saírem.

Já tinha se arrumado todo quando decidiu colocar a joia no pulso. O local estava vazio. Alguém havia furtado a joia e só podia ter sido um dos dois que ali se encontravam, quiçá, os dois de conluio - concluiu Gabriel. Depois de insistir que lhe devolvessem o bem e ante as insistentes negativas, decidiu que faria uma revista aos dois se não quisessem que o fato fosse comunicado à polícia. Ambos aceitaram passar pelo constrangimento e, surpreso, Gabriel não encontrou a joia com eles.

Se passaram alguns dias e Gabriel continuava encafifado com o desaparecimento da joia e, segundo suas conjecturas, não podia ter sido mais ninguém a não um dos dois ou os dois, de coluio, como já dissemos. A empregada da casa seria a primeira suspeita, conforme lhe informou o amigo ofendido ante a insistência de Gabriel em achar que ele estaria envolvido no sumiço da joia.

O maior suspeito de Gabriel era o rapaz amigo de seu amigo. Decidiu insistir com ele e o convidou para um jantar. Durante o jantar deixou claro que era o rapaz o maior suspeito e que, naquele momento exato, se o rapaz não quisesse continuar por suspeito, deveria se submeter a nova revista. Embora o constrangimento evidente, o rapaz se dirigiu ao banheiro do restaurante e tirou todas as peças para que não restasse dúvidas de que não estava de posse da joia. 

Mas, o rapaz informou que, enquanto Gabriel foi tomar banho, seu amigo de anos havia entrado ao seu quarto e que após isso, foi ao carro estacionado na frente da casa, alegando ter esquecido algo. Agora a desconfiança de Gabriel de deslocava totalmente para o velho amigo. Embora fosse difícil acreditar, não lhe restava alternativa. Mas o amigo era odontologista bem estabelecido - pensava. Será?

Foram várias as tentativas e argumentos que pressionavam o velho amigo a devolver a joia furtada. O amigo insistia em  negar e a jogar a culpa sobre a empregada. Mas, dado momento, depois de ouvir argumento poderoso, decidiu o velho amigo, assumir o furto. Entretanto, estabeleceu condição para a devolução da joia.  Uma quantia em dinheiro foi depositada a conta do dentista ladrão e a joia foi entregue ao seu proprietário que já se encontrava no estado do Pará e não pode enfiar a mão nos dentes do dentista.

Ao retornar à capital federal, compareceu a uma instituição de caridade das mais conceituadas e doou a joia foi rifada e serviu para alimentar, por longo tempo, as crianças soropositivas da casa filantropa. O velho amigo agora era só um ladrão no conceito de Gabriel e não recebeu a sua visita costumeira. A joia, segundo me esclareceu, lhe trouxera aflição e perdas, mas, a doação dela faria, finalmente, o bem. Gabriel voltou para casa feliz com a doação e livre do peso da negatividade da joia. 

Só não me falou o nome do dentista ladrão, embora eu o tenho perguntado. Minha curiosidade se explica: jamais me sentaria da cadeira do dentista ladrão.

Wanderley Lucena


2 comentários:

  1. Gabriel Costa Ribeiro13 de janeiro de 2012 às 20:11

    Querido Wanderley, boa noite. Viu como promessa é dívida? Estou aqui admirando seu blog, fascinado, é claro!. No fundo nunca acreditei que a "estória" verídica que lhe contei fosse realmente virar matéria do seu blog. Li atentamente, obrigado pelos elogios... Sinto-me honrado em saber que as pessoas que tenho a oportunidade de conhecer pensam assim sobre mim... Um otimista... Ontem, Hoje e Sempre... Feliz 2012 o ano todo para nós... Gabriel Costa Ribeiro

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  2. Caro Gabriel;

    Foi um prazer cumprir a promessa. wanderlucena@gmail.com é o meu email. Me adicione.
    Abraço.
    Lucena

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